terça-feira, 22 de setembro de 2015

Filha da (outra) nação

Nasceu uma carioca portuguesa. Contrariando as estatísticas de 80% de partos cesariana no Brasil, consegui dar à luz de parto natural e bastante rápido a meu ver (cinco horas), apesar de ter tido o tempo todo uma equipa médica que me tentava convencer que a cirurgia era o melhor, que a bebé era grande de mais, etc. O próximo passo, agora que rejubilávamos de alegria com mais um membro na família, era tratar da papelada para irmos a Portugal mostrar o novo rebento. Mal sabíamos que uma nova saga estava por começar...
Foi-nos dito que tínhamos de fazer um agendamento na polícia federal do aeroporto internacional do Rio de Janeiro para fazer o passaporte da nossa filha. Pagámos uma taxa e esperámos (a módica quantia) de trinta dias para sermos atendidos. No dia chegamos ao aeroporto com todos os papéis que nos instruíram serem necessários e é-nos informado que antes de tirar o passaporte temos de requisitar uma pesquisa social que comprove que a nossa filha é mesmo nossa e isso significa que a polícia teria de enviar um ofício para a maternidade e outro para o cartório para comprovar tal facto, mesmo que tivéssemos em mãos a certidão de nascimento e os laudos médicos do parto. Esses ofícios seguiram via e-mail e demoraram 45 dias (módica quantia!) a ficarem prontos. E assim o foi porque dia sim dia não telefonava para a polícia federal, para a maternidade e para o cartório para saber do andamento do processo. Finalmente três meses depois conseguimos tirar o passaporte da Júlia (que, vá lá, demorou uma semana a ficar pronto) e podemos voar para a 'terrinha'.  É angustiante ser emigrante e estar impotente diante das próprias vontades, esperar tanto tempo para poder reunir toda a família em Portugal que já não vejo há quase um ano. Estou feliz e ansiosa mas também confesso que agora que seguro os nossos passaportes na mão sinto alguma estranheza e melancolia pelo facto de três serem portugueses e um brasileiro. Acho que pela primeira vez compreendo literalmente a (triste) verdade que os filhos quando nascem é para o mundo, não nos pertencem. Assim o é: a Júlia saiu de dentro de mim mas ela é filha da (outra) nação.